Você conhece o conceito de vacuidade e como ele se relaciona com a liberdade do sofrimento?
Nesse post, vamos conversar um pouquinho sobre o conceito de vacuidade, a relação com o "interser" trazido pelo monge Thich Nhat Hahn e como podemos começar a nos relacionar de uma nova forma com o "eu". Separamos alguns trechos bem especiais de dois livros sobre esse tema.
Algumas vezes, a vacuidade pode ser erroneamente associada unicamente com a palavra vazio, e ser interpretada como o vazio e ausência de coisas. Mas isso está longe de representar seu real significado.
A vacuidade é a verdadeira natureza dos fenômenos incluindo os da mente, com sua capacidade ilimitada de experimentar pensamentos, emoções e sensações. Segundo o monge Thich Nhat Hanh, a vacuidade significa estar repleto de tudo, mas vazio de uma existência isolada. Independentemente de estar vazio e cheio, é preciso antes de mais nada estar, ser presente.
É o senso de abertura que experimentamos ao repousar nossas mentes na verdadeira natureza dos fenômenos. Passamos então a compreender um senso de possibilidade, de que tudo pode surgir, modificar e desaparecer. E compreendemos isso de uma forma que vai além da percepção dos sentidos e da nossa capacidade de conceituar, de traduzir em linguagem.
Segundo um trecho do livro de Stephen Batchelor, Budismo sem Crença, a ‘consciência de si é o fato mais óbvio e central de minha vida e, ao mesmo tempo, o mais impreciso. Se tento encontrar o meu "eu" na meditação, descubro que é como correr atrás da minha própria sombra. Tento alcançá-lo mas não encontro nada. Então ele reaparece em outro lugar. Vejo-o de relance com o canto do olho de minha mente, viro-me em sua direção, e ele já se foi. Cada vez que penso tê-lo capturado, ele se torna alguma outra coisa: uma sensação corporal, um estado de ânimo, uma percepção, um impulso ou simplesmente a própria consciência.
O "eu" pode não ser uma coisa, mas ele também não é nada. Ele simplesmente não pode ser fixado, encontrado. Sou quem sou não por causa de um "eu" essencial que se oculta no âmago de meu ser, mas por causa da matriz de condições sem precedentes e não reproduzível que me formou. Quanto mais exploro o mistério de quem eu sou (ou do que uma coisa é), mais eu apenas continuo seguindo. Esse processo não tem fim, é somente uma trajetória infinita que evita cair nos extremos do ser e do não-ser. Essa trajetória é não apenas o centro, que é livre dessa dualidade, mas o próprio caminho central.’ (trecho extraído do livro “Budismo sem Crenças” – Stephen Batchelor – Palas Athena, p.106)
Batchelor discute ainda o quanto ficamos tentando nos agarrar a uma ideia fixa e imutável de “eu” e do “mundo”, e que, quanto mais precioso esse conceito é para nós, mais tentamos protegê-lo de ataques. Dessa maneira, desse lugar, condicionamos o nosso sofrimento. Nesse sentido, tem mais um trecho do livro dele que vale a pena ler:
“Ao olhar para as coisas como absolutamente separadas e como desejáveis ou temíveis em si mesmas, estabelecemos para nós próprios a tarefa de possuir uma coisa que nunca poderemos ter, ou de erradicar algo que, para começar, nunca existiu. Quando percebemos como as coisas emergem de um fluxo ininterrupto de condições e nele se desvanecem, começamos a ser um pouco mais livres. Reconhecemos como as coisas são relativamente, e não absolutamente, desejáveis ou temíveis. Elas se interconectam e interagem, são reciprocamente contingentes, nenhuma delas é separada do resto”. (trecho extraído do livro “Budismo sem Crenças” – Stephen Batchelor – Palas Athena, p.103 e 104)
O mestre Thich Nhat Hanh traz a palavra “interser” para expressar a profunda interconexão com tudo que existe. Interagimos uns com os outros, influenciamos uns aos outros, e nada do que somos é dissociado de ilimitados elementos, seres e da própria vida em si. Assim, ‘estamos repletos de muitas coisa, e ainda assim vazios de uma existência individual. Assim como a flor, dentro de nós existe terra, água, ar, luz do sol e calor. Existe espaço e consciência. Carregamos conosco os nossos antepassados, nossos pais e avós, a educação, os alimentos e a cultura que recebemos. O cosmo inteiro se uniu para criar a maravilhosa manifestação que representamos. Se retiramos todos esses elementos “não nós”, descobriremos que não resta nada “nosso”.’ (trecho extraído do livro “A Arte de Viver” – Thich Nhat Hahn – Harper Collins, p.22).
E por mais abstrato que o conceito seja, apenas através de práticas meditativas o conceito começa a fazer mais sentido, então, que tal buscar entender mais sobre esse conceito e aplicar essa sabedoria em sua vida?
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Referências:
- “Budismo sem Crenças – a consciência do despertar” – Stephen Batchelor – Palas Athena, 2005.
- “A Arte de Viver” – Thich Nhat Hahn – Harper Collins, 2017.
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